quinta-feira, 10 de março de 2011

Um caminho sem retornoOntem Cavaco Silva, no seu discurso de tomada de posse, iniciou um “caminho sem regresso”.
Já todos tínhamos percebido, as suas atitudes, o discurso de vitória, que este segundo mandato iria ser diferente do primeiro.
A este facto também não é alheio um ligeiro “levantamento de rancho” que se está a instalar no PSD.
Todos já percebemos que o caminho de Passos Coelho está a chegar ao fim. O sector cavaquista, que agrupa os “mendistas”, o grupo do norte e alguns “barões” – neste caso por interesse destes e nada mais – cada vez mais quer estar na linha da frente quando chegarem as eleições, e aqui Passos Coelho é um estorvo e deve ser afastado.
Voltando ao essencial, Cavaco utilizou o discurso da tomada de posse como arma de arremesso contra o Governo, no sentido de ir preparando o terreno para o que vai fazer a seguir.
Mas Cavaco tem de pensar que não é detentor de toda a sabedoria e que os portugueses que o elegeram podem numa primeira fase aplaudir este mesmo discurso, até porque estão no momento em que sentem mais na “pele” as medidas de austeridade do próprio governo, mas a prazo intermédio vão perceber as incongruências do discurso e aí o que agora pode ter sido uma excelente táctica, pode vir a revelar-se um pesado erro de comando.
Passemos então aos factos, sendo que devo ressalvar que as citações do discurso e que vão a bold, foram retidadas da publicação feita pelo jornal Público.
Disse cavaco que “Nos últimos dez anos, a economia portuguesa cresceu a uma taxa média anual de apenas 0,7%, afastando-se dos nossos parceiros da União Europeia. Esta divergência foi ainda mais evidente no caso do Rendimento Nacional Bruto, que constitui uma medida aproximada do rendimento efectivamente retido pelos Portugueses. O Rendimento Nacional Bruto per capita, em termos reais, cresceu apenas 0,1% ao ano, reflectindo na prática uma década perdida em termos de ganhos de nível de vida. De acordo com as últimas estimativas do Banco de Portugal, “o crescimento potencial da economia portuguesa, o qual determina a capacidade futura de reembolso do endividamento presente”, é actualmente inferior a 1% e, em 2010, o valor real do investimento ficou cerca de 25% abaixo do nível atingido em 2001.”
Cavaco poderia e deveria ter ido mais longe. Deveria ter dito que durante o seu consolado como primeiro ministro o volume de dinheiro que se recebeu, não foi usado para revitalizar e recuperar a nossa economia, no sentido de ela seguir uma trajectória que hoje lhe permitisse estar a salvo desta hecatombe. Possivelmente esta não lembrança terá sido uma questão de pormenor.
E continua “A resolução dos problemas exige plena consciencialização da situação em que estamos. É urgente encontrar soluções, retomar o caminho certo e preparar o futuro. Esta é uma tarefa que exigirá um esforço colectivo, para o qual todos somos chamados a contribuir.”
Mas que caminho é esse’ O que o Governo legitimamente alicerçado em consulta eleitoral, ou será que o Presidente quer outra gente que percorra o caminho dele, mesmo que essa gente não seja aprovada por uma qualquer consulta eleitoral. E aqui recordo as palavras de Luís Marques Mendes na entrevista ao Correio da Manhã que fala de um PR mais interventivo (e será bom não esquecer Rui Rio que também diz "[Portugal]está a viver o fim do regime que nasceu com o 25 de Abril de 1974". Olhando para isto talvez não seja disparatado dizer que os desejos de um sistema presidencialista estão aí instalados e talvez mereça uma atenção redobrada este ponto: “Neste contexto difícil, impõe se ao Presidente da República que contribua para a definição de linhas de orientação e de rumos para a economia nacional que permitam responder às dificuldades do presente e encarar com esperança os desafios do futuro.
Mas continuando: “Foi especialmente a pensar nos jovens que decidi recandidatar-me à Presidência da República. A eles dediquei a vitória que os Portugueses me deram. Agora, no momento em que tomo posse como Presidente da República, faço um vibrante apelo aos jovens de Portugal: ajudem o vosso País!
Façam ouvir a vossa voz. Este é o vosso tempo. Mostrem a todos que é possível viver num País mais justo e mais desenvolvido, com uma cultura cívica e política mais sadia, mais limpa, mais digna. Mostrem às outras gerações que não se acomodam nem se resignam
.”
Espero que Cavaco Silva esteja consciente de que se algo correr mal no próximo dia sábado (dia 12) ele não estará isento de culpas e deverá tirar daí as devidas ilacções.
E o que significa viver num País “com uma cultura cívica e política mais sadia, mais limpa, mais digna”?
Eu precisava que alguém me explicasse isto. Não sou capaz de perceber! O País tem uma cultura cívica suja? Mas qual cultura cívica? A que promove o Banco Alimentar Contra a Fome? A cultura cívica que se desloca de noite no acompanhamento dos sem abrigo?
É a cultura política que é suja? E o que é a cultura política? Será que é aquela que criou, usou e abusou do BPN? Ou é a cultura daqueles que sendo políticos, se recusam a enfileirar a coluna? Ou são tão só aqueles que enquanto governantes assim os contratos com empresas que no imediato à sua saída do poder, vão administrar?
Resta agora a última citação. Diz Cavaco “Há limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos”.
Cavaco sabe que vão ser precisos mais sacrifícios e assim sendo o que fará Cavaco?
Mais haveria para dissecar no discurso da tomada de posse, mas basta de citações.
Importa referir que Cavaco escolheu um caminho do qual não pode fugir. Mas curiosamente agora gosta de referir que ninguém o escutou. Mas será que ele se escutou a si próprio?
Se ele julgava que aquele não era o caminho certo porque não teve a coragem de intervir? Precisava do 2.º mandato? Para quê? É necessário que esclareça.
Assim sendo espero para ver qual a posição de Cavaco Silva se os transportadores decidirem adoptar medidas de força para obter benefícios pelos combustíveis.
Aguardo as próximas semanas, sabendo desde já que o lume está aceso e a panela já tem água. Resta saber se o Governo está disposto a ser cozido. Eu por mim não estava.

Sem comentários:

não sei porquê (ou até sei) mas parece que é preciso ajudar Marcelo a terminar o mandato com dignidade