morreu Francisco Pinto Balsemão.
é inegável o legado que deixou em matéria de comunicação social.
a Impresa era a menina bonita dos seus olhos, foi ele que lhe deu vida, que dela tomou conta sempre em prol da liberdade de expressão.
partiu sem ter de ver a tomada do grupo por mãos italianas.
termino a escrita de hoje com um excelente artigo de opinião de Pacheco Pereira, publicado no Público de 18 de outubro.
obrigado pela lucidez
No centro da crise da esquerda em Portugal está o PS. O PS, mesmo apesar de as suas políticas reais muitas vezes não se distinguirem das da direita, era o grande depositário dos votos à esquerda em Portugal. Juntava-se-lhe o PCP nos seus tempos passados por baixo, e o Bloco por cima. O PS era o partido da governação, e em determinadas circunstâncias agregava a si o PCP e o Bloco, como a fronteira ao voto no PSD, criando uma separação com a direita e, ocasionalmente, com o centro-direita.
Mesmo quando não tinha o PCP e o Bloco ao seu lado, mesmo quando estes o atacavam, o PS era o muro eleitoral que impedia a direita de chegar ao poder ou a limitava no exercício do poder. Mesmo quando perdia eleições, estava lá e era um muro fiável pela sua dimensão. Tinha fissuras e tentações, mas não era possível o descalabro da esquerda sem o PS tombar. E o PS está a cair, eleitoralmente, politicamente e ideologicamente, e arrasta atrás de si o Bloco e o PCP. Apenas o Livre tem resistido.
A vaga de direita não começou agora, mas de algum modo mudou qualitativamente com a aparição do Chega. O Chega é o grande revolucionário do sistema político-partidário e, embora não tenha acabado com o bipartidarismo, enfraqueceu-o na sua utilidade para o partido do Governo, que agora tem sempre duas opções. Este processo é também favorecido pela deslocação à direita do PSD desde os tempos da troika, com o abandono dos últimos sinais da social-democracia da sua génese. Este processo foi agravado pela tentativa de competir com o Chega, adoptando a sua agenda. Os resultados não têm sido brilhantes.
Há hoje vitórias eleitorais do PSD sobre o PS, a mais importante é a que traduz a ocupação do voto urbano pelo PSD. Mas há igualmente vitórias políticas e ideológicas. A vitória táctica mais relevante foi a de interiorizar no PS os argumentos da direita sobre a crise dos socialistas. A ideia de que o PS tem perdido por causa de uma sua putativa radicalização e esquerdização entrou no lugar-comum, mas está longe de ser verdadeira. O PS não se radicalizou, bem pelo contrário, e mesmo o anterior secretário-geral foi o que inverteu o sentido útil da política de imigração, o que não é de somenos.
A chantagem política e ideológica do aparelho comunicacional da direita, cada vez mais forte, passa pelo apoio às claras ou disfarçado a José Luís Carneiro, a António José Seguro e, nas autárquicas, a Ricardo Leão, em Loures, e, pela divisão em Lisboa, a João Ferreira, do PCP. A que se soma uma clara chantagem política sobre o Orçamento e, em linhas gerais, a qualquer entrave que o PS possa colocar às políticas do Governo.
Hoje, a mínima afirmação de qualquer política que pareça vagamente merecer o nome de socialista é imediatamente classificada de “ideológica” versus técnica, e “radical”. E quando se analisa o conteúdo dessas políticas hoje consideradas “radicais”, são políticas que não são mais do que de centro-esquerda ou sociais-democratas, que há alguns anos ninguém classificaria como “radicais”.
A mínima afirmação de qualquer política que pareça vagamente merecer o nome de socialista é imediatamente classificada de 'ideológica' versus técnica, e 'radical'
E o PS, mais por inacção do que por acção, tem-se deixado manietar por este cerco, que inclui o domínio cada vez maior da direita pela capacidade de classificar, nomear, “chamar nomes”. Uma comunicação social, hoje muito dominada pela direita, funciona como megafone para as classificações. O Chega insulta, o PSD e o CDS nomeiam, e o PS passa da afirmação à justificação.
É certo que há um vento de direita nas democracias que o populismo faz soprar mais forte, mas é também verdade que a esquerda tem muita responsabilidade na criação de condições para esse vento, em particular em Portugal. O resto da esquerda abriu também caminho para esta perda de identidade e correlativa fragilização. O Bloco nunca deixou de ser um partido de elite com causas de elite, e o seu abandono da luta social a favor das “causas fracturantes” ajudou a criar um mundo de espectáculo muitas vezes afrontoso ao cidadão comum. O PCP, que tinha na esquerda um quase monopólio da luta social, tornou-se um sindicato médio, preso nas suas metacausas pela posição a favor da rendição da Ucrânia, a que chama “paz”.
A actual crise da esquerda portuguesa não passa apenas pela sua crise de identidade, passa também por uma perda de coragem política, pela sua moleza numa ecologia política muito agressiva à direita. Como os democratas americanos face a Trump, que só agora começam a perceber que o medo e a voz baixa só fortalecem uma política que assume hoje a forma dominante de bullying.
Por tudo isto, ideias, políticas e métodos, a direita domina a governação e a política, o Chega controla a agenda e a “narrativa”, o PS voa tão baixinho que dizer que voa é um exagero, e hoje o consumo da política, fundamental, em democracia mudou-se para locais mal frequentados como as redes sociais. Uma geração está a crescer nesta ecologia e não vai ser grande coisa.
Resistir é o único verbo com dignidade, vai ser duro, leva tempo e faz estragos, mas é a única maneira de travar a ascensão da brutalidade, da ignorância e de uma sociedade de pobres e excluídos, perdidos na sua invisibilidade."
Mesmo quando não tinha o PCP e o Bloco ao seu lado, mesmo quando estes o atacavam, o PS era o muro eleitoral que impedia a direita de chegar ao poder ou a limitava no exercício do poder. Mesmo quando perdia eleições, estava lá e era um muro fiável pela sua dimensão. Tinha fissuras e tentações, mas não era possível o descalabro da esquerda sem o PS tombar. E o PS está a cair, eleitoralmente, politicamente e ideologicamente, e arrasta atrás de si o Bloco e o PCP. Apenas o Livre tem resistido.
A vaga de direita não começou agora, mas de algum modo mudou qualitativamente com a aparição do Chega. O Chega é o grande revolucionário do sistema político-partidário e, embora não tenha acabado com o bipartidarismo, enfraqueceu-o na sua utilidade para o partido do Governo, que agora tem sempre duas opções. Este processo é também favorecido pela deslocação à direita do PSD desde os tempos da troika, com o abandono dos últimos sinais da social-democracia da sua génese. Este processo foi agravado pela tentativa de competir com o Chega, adoptando a sua agenda. Os resultados não têm sido brilhantes.
Há hoje vitórias eleitorais do PSD sobre o PS, a mais importante é a que traduz a ocupação do voto urbano pelo PSD. Mas há igualmente vitórias políticas e ideológicas. A vitória táctica mais relevante foi a de interiorizar no PS os argumentos da direita sobre a crise dos socialistas. A ideia de que o PS tem perdido por causa de uma sua putativa radicalização e esquerdização entrou no lugar-comum, mas está longe de ser verdadeira. O PS não se radicalizou, bem pelo contrário, e mesmo o anterior secretário-geral foi o que inverteu o sentido útil da política de imigração, o que não é de somenos.
A chantagem política e ideológica do aparelho comunicacional da direita, cada vez mais forte, passa pelo apoio às claras ou disfarçado a José Luís Carneiro, a António José Seguro e, nas autárquicas, a Ricardo Leão, em Loures, e, pela divisão em Lisboa, a João Ferreira, do PCP. A que se soma uma clara chantagem política sobre o Orçamento e, em linhas gerais, a qualquer entrave que o PS possa colocar às políticas do Governo.
Hoje, a mínima afirmação de qualquer política que pareça vagamente merecer o nome de socialista é imediatamente classificada de “ideológica” versus técnica, e “radical”. E quando se analisa o conteúdo dessas políticas hoje consideradas “radicais”, são políticas que não são mais do que de centro-esquerda ou sociais-democratas, que há alguns anos ninguém classificaria como “radicais”.
A mínima afirmação de qualquer política que pareça vagamente merecer o nome de socialista é imediatamente classificada de 'ideológica' versus técnica, e 'radical'
E o PS, mais por inacção do que por acção, tem-se deixado manietar por este cerco, que inclui o domínio cada vez maior da direita pela capacidade de classificar, nomear, “chamar nomes”. Uma comunicação social, hoje muito dominada pela direita, funciona como megafone para as classificações. O Chega insulta, o PSD e o CDS nomeiam, e o PS passa da afirmação à justificação.
É certo que há um vento de direita nas democracias que o populismo faz soprar mais forte, mas é também verdade que a esquerda tem muita responsabilidade na criação de condições para esse vento, em particular em Portugal. O resto da esquerda abriu também caminho para esta perda de identidade e correlativa fragilização. O Bloco nunca deixou de ser um partido de elite com causas de elite, e o seu abandono da luta social a favor das “causas fracturantes” ajudou a criar um mundo de espectáculo muitas vezes afrontoso ao cidadão comum. O PCP, que tinha na esquerda um quase monopólio da luta social, tornou-se um sindicato médio, preso nas suas metacausas pela posição a favor da rendição da Ucrânia, a que chama “paz”.
A actual crise da esquerda portuguesa não passa apenas pela sua crise de identidade, passa também por uma perda de coragem política, pela sua moleza numa ecologia política muito agressiva à direita. Como os democratas americanos face a Trump, que só agora começam a perceber que o medo e a voz baixa só fortalecem uma política que assume hoje a forma dominante de bullying.
Por tudo isto, ideias, políticas e métodos, a direita domina a governação e a política, o Chega controla a agenda e a “narrativa”, o PS voa tão baixinho que dizer que voa é um exagero, e hoje o consumo da política, fundamental, em democracia mudou-se para locais mal frequentados como as redes sociais. Uma geração está a crescer nesta ecologia e não vai ser grande coisa.
Resistir é o único verbo com dignidade, vai ser duro, leva tempo e faz estragos, mas é a única maneira de travar a ascensão da brutalidade, da ignorância e de uma sociedade de pobres e excluídos, perdidos na sua invisibilidade."
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