terça-feira, 6 de dezembro de 2005

Atinem senhores, atinem

Foi hoje notícia no “Público” de que o Ministério da Educação quer reduzir o número de exames nacionais que os alunos têm de fazer no final do ensino secundário. A proposta apresentada prevê que os alunos façam apenas três provas de avaliação externa e que o Português e a Filosofia deixem de ser obrigatórios para todos os cursos. No que concerne ao de Português, ele só seria obrigatório para os alunos de Línguas e Literaturas.
Justifica o secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, que “o objectivo [desta proposta] é centrar os exames nas áreas nucleares dos cursos e fazer com que a conclusão do secundário e o acesso ao ensino superior sejam dois momentos diferentes”.
Perante isto deixe-me perguntar-lhe, sr. Secretário de Estado, há quanto tempo está afastado do contacto directo com a leccionação, se é que alguma vez esteve? Há quanto tempo não corrige um teste ou um exame, sejam eles do secundário ou do superior?
Estou em crer que está afastado destas lides há demasiado tempo.
É público e notório que o grande problema do ensino em Portugal, não está nesta ou naquela disciplina, em serem cinco ou seis exames e outras questões que tais. O problema é muito mais vasto.
O secretário de Estado saberá melhor do que eu, por isso é que ele ocupa a pasta que ocupa e eu sou um cidadão comum, que a iliteracia é o calcanhar de Aquiles que afecta fortemente a sociedade portuguesa, sendo que essa palavra significa, segundo o dicionário da Porto Editora, «1. dificuldade em ler e interpretar, e escrever; 2. falta de conhecimentos considerados básicos; analfabetismo.».
E este "calcanhar de Aquiles" não afecta somente uma faixa etária da nossa sociedade, ele atravessa-a diametralmente.
E isto porquê? Não só porque se perdeu o contacto com a leitura e, por arrasto, a capacidade interpretativa, sendo que a formação a nível da Língua Portuguesa se foi deteriorando.
Não se duvide de que os problemas que se verificam na Matemática são exclusivos da Matemática como ciência propriamente dita. Uma grande percentagem dos problemas, talvez mesmo a maior percentagem, fica a dever-se à incapacidade dos alunos na interpretação do que lhes é pedido. Citei a Matemática, mas com as outras áreas passa-se a mesma coisa.
É por isto que eu estou contra o Ministério acabar com os exames de Português. Ao invés o Ministério deveria fazer tudo para incrementar o ensino do Português e fazer entender aos alunos de que é uma disciplina fundamental seja em que curso for e que como tal deverá estar sujeita a exame.
A menos que o Estado esteja interessado na criação de autómatos, julgo que é um projecto que deverá ter como destino o cesto dos papéis.

Ainda a Educação

Ainda a guerra do crucifixo não terminou (basta ler os artigos de opinião nos diversos jornais) e já outra se perfila no horizonte. Estou a referir-me aos manuais escolares.
Como todos sabemos o livro escolar é um mercado muito apetecido, sendo que algumas editoras nascem e vivem somente do livro escolar.
O que tem acontecido ultimamente é que a vertente economicista se sobrepôs à vertente formadora, o que está errado porquanto deveria prevalecer sempre o inverso.
E não estou a falar de cor.
Tomemos como exemplo os livros do ensino recorrente por unidades capitalizáveis editados pelo Ministério da Educação. Se fossem sujeitos a uma comissão de certificação, estou certo de que eram chumbados na íntegra, tão maus eles são (deixo de fora o aspecto gráfico, fico-me só pelo conteúdo).
Avancemos com mais um exemplo. Literatura Portuguesa no Mundo. Dicionário Ilustrado de Célia Vieira e Isabel Rio Novo da Porto Editora. No I volume (de A a Azevedo) na entrada Abelha na Chuva, Uma (pág. 16) na 3.ª linha diz-se: "... o casal Leopoldina e Álvaro...", claro que as autoras se devem estar a referir a Álvaro Silvestre, comerciante e lavrador, e D. Maria dos Prazeres Silvestre, descendente dos fidalgos da Casa de Alva, arruinada. Leopoldina, que eu me lembre só se for a do mundo dos brinquedos do Continente. Mas atenção que esta obra tem mais. E não é uma obra qualquer. Trata-se de um acompanhamento fundamental para os alunos de Literatura.
Isto são só dois exemplos. Se vasculharmos os manuais escolares encontraremos muitos mais e os docentes sabem bem do que falo (estranho que ainda não ouvi da boca deles nenhum comentário sobre este assunto).
Por isto tudo venha a certificação dos manuais escolares e depressa.
O projecto está em http://www.sepleu.pt/outros/manuais_anteprojecto.pdf

Finalmente

Por fim uma observação muito simples sobre o primeiro debate para as eleições presidenciais.
Só um excesso de boa vontade poderá chamar ao que ontem aconteceu um debate. Para mim tratou-se de um quase num monólogo civilizado, uma conversa cordata e cautelosa, em que sobre a maioria dos temas, os dois candidatos estiveram de acordo.
Manuel Alegre teria tudo a ganhar em provocar a ruptura em temas específicos mas nunca o fez. Alegre foi cordato e respeitoso, politicamente correcto, tendo desperdiçado uma boa oportunidade para se afirmar como o candidato da esquerda.
Por certo que Soares deve ter dado pulos de satisfação ao romantismo argumentativo de Alegre.
Posso-me enganar, mas Manuel Alegre perdeu ontem a sua hipótese de ir à segunda volta.
Cavaco apresentou-se como o profissional, pleno de serenidade e cultivando o seu habitual estilo presidencialista. Vestiu mais uma vez a capa da humildade querendo com isso retirar espaço de manobra aos que o acusam de prepotente e autoritário.
Resumindo: Cavaco preparou e Alegre participou no monólogo civilizado que o primeiro queria e acabou por conduzir conduziu.

Sem comentários:

Cavaco pede para este aquilo que não permitiu para os anteriores... a história fará a justeza de o ignorar quando a morte vence é sinal da ...